Para ministros, Azeredo perdeu foro privilegiado no Supremo ao renunciar. Ex-deputado vai responder por peculato e lavagem na Justiça de Minas
Por maioria de votos (oito a um), o plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu nesta quinta-feira (27) enviar para a primeira instância da Justiça de Minas Gerais a ação penal contra o ex-deputado federal Eduardo Azeredo (PSDB-MG) pelo caso conhecido como mensalão tucano. O único ministro a votar para que o Supremo julgasse o ex-parlamentar foi o presidente da Corte, Joaquim Barbosa.
Azeredo é acusado de peculato e lavagem de dinheiro por ter supostamente desviado recursos públicos, por meio de empresas de publicidade, para sua campanha à reeleição ao cargo de governador em 1998.
Outros acusados de envolvimento, como o empresário Marcos Valério - condenado como operador do mensalão do PT no Supremo - são processados por varas da Justiça Estadual e Federal em Minas.
Os ministros consideraram que, ao renunciar ao mandato, Eduardo Azeredo perdeu o foro privilegiado. Pela lei, o Supremo só pode julgar autoridade com foro, como parlamentar e ministro de Estado. A maioria dos magistrados também considerou que não houve intenção de atrasar o processo com a renúncia.
Com a decisão do STF, Azeredo terá mais chances de recursos. Caso condenado na primeira instância, poderá recorrer à segunda instância, depois ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) e somente então ao Supremo. Com isso, pode levar mais tempo para que o processo transite em julgado, ou seja, não caiba mais recurso.
Após a decisão, Azeredo diz esperar que o julgamento na primeira instância ocorra "sem suposições". "Espero ainda que o processo siga seu curso sem a contaminação política que tem feito de mim o bode expiatório de toda esta situação. Confio na decisão da Justiça."
Apesar da remessa do processo contra Azeredo para a Justiça de Minas, outra ação sobre o mensalão tucano permanecerá no Supremo, contra o senador Clésio Andrade (PMDB), que foi candidato a vice de Azeredo durante as eleições de 1998 em Minas.
Votos dos ministros
Magistrado com mais tempo de atuação no Supremo, Celso de Mello destacou que, no caso do tucano, não há risco de prescrição da pena, quando, em razão do tempo decorrido do suposto fato criminoso, não pode mais haver punição.
"Não havendo risco para o interesse público, entendo que a renúncia exercida de modo legítimo faz cessar a competência do Supremo Tribunal Federal", disse Celso de Mello.
Último a votar, o presidente do Supremo, Joaquim Barbosa, foi o único a defender que o processo continuasse na Corte. Barbosa foi relator do processo antes de assumir a presidência e, então, o caso migrou para a relatoria de Barroso. Para Joaquim Barbosa, a renúncia não pode servir como "ardil para se esquivar ou retardar a decisão".
"A finalidade do réu é evitar o julgamento não somente por esta Corte, mas pelo juiz de primeiro grau. Ao que tudo indica, a prescrição deverá se concretizar. Deixar ao arbítrio da parte o poder de escolha do seu julgador representa uma verdadeira afronta à efetividade da prestação jurisdicional e, de certa forma, deboche ao poder Judiciário, o que retira ao meu ver qualquer legitimidade e eficácia que a renúncia possa ter em detrimento do prosseguimento da ação penal na condição em que se encontra."
Argumentos dos ministros
O relator da ação, ministro Luís Roberto Barroso, afirmou que, por entendimentos anteriores do Supremo, o ex-deputado perdeu o foro privilegiado ao renunciar ao mandato.
O ministro propôs, porém, que a Suprema Corte estipulasse uma regra para os próximos casos nos quais parlamentares processados renunciem ao mandato. Para ele, quem renunciasse após o recebimento da denúncia pelo plenário deveria ser julgado pelo Supremo. Não houve consenso, e a decisão sobre um critério foi adiada.
"Ele [Azeredo] renunciou para não se submeter ao Supremo, não tenho dúvida. Tenho dificuldade de considerar abusivo porque o Supremo nunca considerou que renúncia é abuso de direito. Se não tivermos critério objetivo, não podemos dizer se houve ou não abuso", afirmou Barroso.
O ministro Luiz Fux destacou que todo cidadão sem foro privilegiado tem direito ao chamado "juiz natural", ou seja, ser julgado pela primeira instância. "No caso concreto, o processo está pronto para ser julgado. Se baixar, está pronto para emitir a sentença. Quem garante que aqui não vá demorar mais?"
A ministra Rosa Weber frisou, em seu voto, que não se pode "sempre presumir o intuito malicioso" na renúncia. "Não podemos, no meu ponto de vista, sempre presumir o intuito malicioso. Pode haver hipótese de doença grave, pode ter um motivo legítimo. [...] A prerrogativa de função [foro privilegiado] pressupõe o exercício do mandato. Eu, no caso concreto, voto no sentido da imediata remessa dos autos ao juiz competente."
Dias Toffoli propôs que os parlamentares que renunciarem continuem a ser julgados no Supremo caso o relator da ação já tenha preparado o voto para que "o tempo de um juiz da Suprema Corte" e o trabalho não vá "para a lata do lixo".
Foro privilegiado
Durante o julgamento, Barroso disse que o ideal seria que uma vara do Distrito Federal, com magistrados indicados pelo Supremo, ficasse responsável pelos processos contra parlamentares para desafogar o Supremo.
Outros ministros disseram que isso só seria possível com uma emenda à Constituição, que estabelece o foro privilegiado no Supremo.
G1
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